domingo, 31 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo final
" Fica proibido o uso da palavra liberdade
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas .
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio ,
e a sua morada será sempre
o coração do homem ."
Thiago de Mello
sábado, 30 de outubro de 2010
Ah ! Clarice ... sempre ela
" Aqui em casa pousou uma esperança .
Não a clássica que tantas vezes verifica-se
ser ilusória , embora mesmo assim nos
sustente sempre . Mas a outra , bem concreta
e verde : o inseto.
Houve um grito abafado de um dos meus filhos :
_ Uma esperança ! e na parede bem em cima de
sua cadeira ! Emoção dele também que unia
em uma só as duas esperanças , já tem idade
para isso . Antes surpresa minha : esperança é
coisa secreta e costuma pousar diretamente em
mim , sem ninguém saber , e não acima de minha
cabeça numa parede .
Pequeno rebuliço : mas era indubitável , lá
estava ela ,e mais magra e verde não podia ser .
-Ela quase não tem corpo , queixei-me .
-Ela só tem alma , explicou meu filho e ,
como filhos são uma surpresa para nós ,
descobri com surpresa que ele falava das
duas esperanças."
Clarice Lispector , no conto " Uma Esperança "
sexta-feira, 29 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo XIII
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
As sem razões do amor
" Eu te amo porque te amo .
Não precisas ser amante ,
e nem sempre sabes sê-lo .
Eu te amo porque te amo .
Amor é estado de graça
e com amor não se paga .
Amor é dado de graça ,
é semeado no vento ,
na cachoeira , no eclipse .
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários .
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim .
Porque amor não se troca ,
não se conjuga nem se ama .
Porque amor é amor a nada ,
feliz e forte em si mesmo .
Amor é primo da morte ,
e da morte vencedor ,
por mais que o matem ( e matam )
a cada instante de amor ."
Carlos Drummond de Andrade
quarta-feira, 27 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo VIII
terça-feira, 26 de outubro de 2010
O rio do meio
" Entre sótãos e porões segue o rio do meio .
Não interrompe seu curso quando dormimos ou
comemos , quando amamos ou nos frustamos ,
quando executamos projetos ou achamos que a nossa
força acabou .
Na margem , garças distraídas .
Inesperadamenre uma delas joga-se no que parece
o mergulho definitivo , mas voltará depois de
varar o escuro , bico apontado para um sol que
já não cega mais .
Uma torrente vara a nossa casa : demora-se no
cotidiano , dispara nas euforias , arrasta destroços
ou empurra esperanças , às vezes por gargantas
noturnas .
Mas há de emergir - com os ímpetos de um parto -
numa explosão de claridade . Isso , somos ."
Lya Luft , in " O rio do meio "
segunda-feira, 25 de outubro de 2010
Canção Mínima
domingo, 24 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo VII
sábado, 23 de outubro de 2010
Mario Qintana
sexta-feira, 22 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo IX
quinta-feira, 21 de outubro de 2010
Primeira Lição
quarta-feira, 20 de outubro de 2010
Brinquedos
terça-feira, 19 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo VI
segunda-feira, 18 de outubro de 2010
Dia do médico
" Instrumentos musicais existem não por causa
deles mesmos mas pela música que podem produzir.
Dentro de cada instrumento há uma infinidade de
melodias adormecidas , à espera de que acordem do
seu sono . Quando elas acordam e a música é ouvida ,
acontece a Beleza , e com a Beleza , a Alegria .
O corpo é um delicado instrumento musical .
É preciso cuidar dele , para que ele produza música.
Para isso , há uma infinidade de recursos médicos .
E muitos são eficientes .
Mas o corpo, esse instrumento estranho , não se
cura só por aquilo que se faz medicamente com ele .
Ele precisa beber a sua própria música .
Música é remédio .
Médicos : cuidam dos remédios e das intervenções
físicas - bons para o corpo - mas tratam de
acender a chama misteriosa da alegria
Ela se acende magicamente .
Precisa da voz , da escuta , do olhar ,
do toque , do sorriso .
Médicos : ao mesmo tempo técnicos e mágicos ,
a quem é dada a missão de consertar os instrumentos
e despertar neles a vontade de viver ."
Rubem Alves
Parabéns aos médicos !
Agradeço , beijo e abraço todos ,
especialmente os que estão sempre ao meu lado .
domingo, 17 de outubro de 2010
Definição do dia ...
Ser criança
" Por não saber como é para ser ,
deixar que seja como for .
Compreender formiga .
Admirar ferrolho .
Não ter regra para achar .
Não ter razão para perder .
Duvidar de tudo .
Duvidar de nada .
Ter um monte de " a primeira vez " para gastar .
Admitir contradição .
Não economizar " porque não ? "
Dar importância a lápis .
Se extasiar com tampas .
Ter uma vida para inventar .
Ser criança ."
Adriana Falcão
sábado, 16 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo XII
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Um Retrato
" Não sei quem eu era
quando era menino .
Procuro no tempo ,
procuro no espelho .
Retratos me dizem
que eu era franzino .
Eu era de vidro,
mas não me quebrei .
Os astros disseram
que eu era taurino .
Estrelas , planetas ,
que sabem de mim ?
Daquele garoto
eu sou seu destino .
Foi tudo tão rápido !
Foi tão repentino !
Não sei quem eu era .
Talvez fosse eu ."
Eucanaã Ferraz
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Nuvens ( I )
" Não há uma só coisa que não seja
nuvem . Assim são essas catedrais
de vasta pedra e bíblicos cristais
que o tempo alisa .
A Odisséia , veja , muda como o mar ;
há algo distinto a cada vez que a abrimos .
Seu velho rosto já é outro , visto
no espelho , e o dia é um duvidoso
labirinto . Somos os que se vão .
A volumosa nuvem que se desmancha no
poente é a nossa imagem .
Incessantemente a rosa se converte em
outra rosa .
Você é nuvem , mar, esquecimento.
E é o que perdeu a cada momento. "
Jorge Luis Borges
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo V
terça-feira, 12 de outubro de 2010
Dia da padroeira do Brasil
" É de sonho e de pó , o destino de um só ,
Feito eu perdido em pensamentos
Sobre meu cavalo .
É de laço e de nó , de gibeira o jiló ,
dessa vida comprida a só .
Refrão :
Sou caipira Pirapora Nossa
Senhora de Aparecida
Ilumina a mina escura e funda
O trem da minha vida .
O meu pai foi peão , minha mãe solidão
Meus irmãos perderam-se na vida
Em busca de aventuras .
Descasei , joguei , investi, desisti ,
Se há sorte eu não sei , nunca vi .
Me disseram porém que eu viesse aqui
Pra pedir de romaria e prece
Paz nos desaventos .
Como não sei rezar , só queria mostrar
Meu olhar , meu olhar , meu olhar .
Sou caipira , Pirapora Nossa
Senhora de Aparecida
Ilumina a mina escura e funda
O trem da minha vida ."
Romaria , música de Renato Teixeira
segunda-feira, 11 de outubro de 2010
Soneto do dia ...
" Não te quero senão porque te quero
e de querer-te a não querer-te chego
e de esperar-te quando não te espero
passa meu coração do frio ao fogo .
Te quero só porque a ti te quero ,
te odeio sem fim , e odianto-te rogo ,
e a medida de meu amor viageiro
é não ver-te e amar-te como um cego .
Talvez consumirá a luz de janeiro
seu raio cruel , meu coração inteiro
roubando-me a chave do sossego .
Nesta história só eu morro
e morrereria de amor porque te quero ,
porque te quero , amor a sangue e fogo ."
Pablo Neruda , in " Cem Sonetos de Amor " , LXVI
domingo, 10 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo III
sábado, 9 de outubro de 2010
Marina Colasanti : No reverso da palavra
( ...)
" É a metáfora que nos alça ao imaginário .
Como no sonho , só através de signos e
metáforas o imaginário se expressa e se deixa
penetrar. Pois o imaginário não é a palavra .
É o que está atrás da palavra.
(...)
Por trás de todas as histórias de casas assombradas
com ventos que uivam e portas que rangem , há uma
única e grandiosa história , a do pequeno ser humano
enfrentando corajosamente sua finitude .
( ... )
As palavras nos contam de uma casa e de um fantasma ,
um ser vindo do além . Mas por trás das palavras a
casa é um corpo humano , e a presença do além é a
morte que o assombra desde o momento em que nasceu .
E onde as palavras contam que a casa está vazia porque
ninguém se atreve a enfrentar o fantasma , o reverso
das palavras nos diz que quem não enfrenta seus medos
não é dono de si , não se habita .
E quando as palavras relatam como a personagem
decide assumir a casa , enfrentar o fantasma e
derrotá-lo ao fim da história ,lemos por trás delas
que a coragem é possível ,que nossa vida nos pertence
na medida que enfrentamos a morte , até o fim daquela
breve história que é a nossa ."
Marina Colasanti , in " Fragatas para Terras Distantes " , ensaios
sexta-feira, 8 de outubro de 2010
Mario Vargas Llosa
quinta-feira, 7 de outubro de 2010
quarta-feira, 6 de outubro de 2010
Leminski , na quarta ...
" Meu professor de análise sintática era o tipo do
sujeito inexistente .
Um pleonasmo , o principal predicado da sua vida ,
regular com um paradigma da 1 ª conjugação .
Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial ,
ele não tinha dúvidas : sempre achava um jeito
assindético de nos torturar com um aposto .
Casou com uma regência .
Foi infeliz .
Era possessivo como um pronome .
E ela era bitransitiva .
Tentou ir para os EUA .
Não deu .
Acharam um artigo indefinido em sua bagagem .
A interjeição do bigode declinava partículas expletivas ,
conetivos e agentes da passiva , o tempo todo .
Um dia , matei-o com um objeto direto na cabeça ."
Paulo Leminski , in " Caprichos e Relachos "
terça-feira, 5 de outubro de 2010
Os Estatutos do Homem : artigo II
segunda-feira, 4 de outubro de 2010
Declaração do dia ...
domingo, 3 de outubro de 2010
Poema de hoje ...
" Ó sino da minha aldeia ,
Dolente na tarde calma ,
Cada tua badalada
Soa dentro da minha alma .
E é tão lento o teu soar ,
Tão como triste da vida ,
Que já a primeira pancada
Tem o som de repetida .
Por mais que me tanjas perto
Quando passo , sempre errante ,
És para mim como um sonho ,
Soas-me na alma distante .
A cada pancada tua ,
Vibrante no céu aberto ,
Sinto mais longe o passado ,
sinto a saudade mais perto ."
Fernando Pessoa , in "Passos da Cruz "
sábado, 2 de outubro de 2010
O apanhador de desperdícios
" Uso as palavras para compor meus silêncios .
Não gosto das palavras
fatigadas de informar .
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo .
Entendo bem o sotaque das águas .
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes .
Prezo inseto mais que aviões .
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis .
Tenho em mim esse atraso de nascença .
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos .
Tenho abundância de ser feliz por isso .
Meu quintal é maior do que o mundo .
Sou um apanhador de desperdícios :
Amo os restos
como as moscas .
Queria que a minha voz tivesse formato de canto .
Porque eu não sou da informática :
eu sou da invencionática .
Só uso a palavra para compor meus silêncios ."
Manoel de Barros
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
Citação do dia ...
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